É insanidade, não há qualquer sombra de dúvida.
São duas da manhã e cheguei agora casa. Estou sentada na minha cama a rabiscar estas palavras numa folha de papel, que agora transcrevo; não trouxe o portátil e não quero, não consigo, deixar de registar tudo que experienciei nestas últimas 3 horas.
Vou passar por cima de todos os pormenores de como conheci o G, há quanto tempo e quem é.
O que te quero contar... é que hoje fiz amor a dançar tango.
Foi uma sugestão que rapidamente passou a desafio e, sendo eu louca (comprovo acima e no decorrer deste texto), aceitei ou até na concordância, estimulei.
Faz forward, esquece as perguntas que lhe disparei para perceber o que se passava ali, se me estava a engatar, da diferença de idades, do objectivo, das segundas intenções, do porquê.
Nada disso interessa.
Se o G já anteriormente sugeriu o mesmo a alguém também não interessa.
A mim nunca me passaria pela cabeça aceitar um convite para dançar tango em casa dele; mas aceitei e isso também não interessa.
What really matters, e que quero guardar nestas palavras foi o flirt, a emoção e sensações, o quente da sua pele e da respiração, do toque das suas mãos no meu corpo, do seu olhar terno e desejável…enquanto dançamos tango.
É certo que ele é iniciado e eu nem aí chego mas não me vou preocupar ou desculpar com a expressão “dançar tango”. Estamos a dar passos de dança, a música que se ouve é de tango…que se lixe, era tango que dançávamos.
Ao falar do G, deixa-me dizer que estamos a falar de um homem que me estimula intelectualmente, que usa conjugações como “lembrar-te-ás” ou “dir-te-ia”, expressões como “não é bom, nem é mau, é o que é” ao mesmo tempo que me faz rir com qualquer disparate; interessa-se por fotografia, culinária, arte, viagens, dança, desporto; replica obras de arte e, mais espirituosa que modestamente, afirma ficar pouco aquém do original; que fala russo e mandarim e me envergonha com o meu francês; que tem olhos verdes e pestanas longas.
Ao som do tango… sinto na sequência de puxadas e rodadas, que o meu corpo reage ao sentir a boca dele tão próxima da minha, os braços a envolverem-me, o respirar na minha orelha, as mãos, pernas, braços…a envolverem-se com as minhas e meus.
As nossas coxas endurecem, relaxam e roçam-se ao longo da execução dos passos; o toque das mesmas com a tensão muscular nas mãos e braços para equilibrar e guiar o meu corpo, ao mesmo tempo que aproximamos e afastamos as faces, trocamos olhares intensos com aparente desconforto e esforçada concentração na minha aprendizagem…
Finalmente, a loucura da situação impôs-se, porque foi a primeira vez que estive com o G, e compeliu-me a insistir que tinha de ir embora.
Ao chegar a casa, passou-me pela cabeça ligar-lhe a convidar para ir ter comigo; mas não o fiz. Ao invés, procurei uma folha de papel e tentei descrever com o ridículo conhecimento da língua portuguesa que me assiste – e que fica seguramente somenos à emoção sentida – o final desta noite.
Arrisquei uma aventura e ganhei momentos que fazem a vida; que guardarei na memória e orgasmaticamente no coração!